Limitar a ingestão de carboidrato ou de gordura resulta em perda de peso semelhante, mostra estudo americano feito com 609 voluntários. Segundo especialistas, o importante é que o regime seja saudável e respeite as características individuais
Primeiro, cortava-se caloria. Depois, a gordura. Então, veio a fase do carboidrato, e todo mundo começou a amaldiçoar o pãozinho de cada dia. Mas, embora as revistas de dieta e as redes sociais de “celebridades” da boa forma insistam em fórmulas, a verdade é que nenhum regime alimentar para perda de peso é melhor que o outro. Um estudo publicado ontem na Revista da Associação Médica Norte-Americana (JAMA) mostrou que, ao longo de um ano, o emagrecimento de 609 adultos com sobrepeso divididos nos grupos de low carb e de low fat foi igual. Segundo os autores, isso reforça que, desde que saudável, qualquer programa de emagrecimento pode dar certo, respeitando as individualidades.
No artigo, eles justificam o estudo explicando que pesquisas anteriores observaram uma variação na resposta a esses dois tipos de dieta, com pessoas perdendo até 25kg, enquanto outras ganharam 5kg. “Todos nós ouvimos histórias de um amigo que fez uma dieta que funcionou muito bem, enquanto para outro não deu certo de forma alguma”, disse, em nota, Christopher Gardner, professor de medicina da Universidade de Stanford, na Califórnia, e principal autor do trabalho. “É porque somos todos diferentes e estamos começando a entender as razões para essa diversidade. Talvez não devêssemos perguntar qual é a melhor dieta, mas qual a melhor dieta para quem.” Alguns sugerem que diferenças genéticas poderiam influenciar o tipo de dieta mais adequado para cada um. A fim de testar essa hipótese, os pesquisadores da Califórnia recrutaram 600 pessoas residentes no estado, de ambos os sexos, com idade entre 18 e 50 anos e índice de massa corporal (peso dividido pela altura ao quadrado) de 28 (sobrepeso) a 40 (obesidade severa). Elas foram divididas em dois grupos aleatoriamente: dieta low carb ou low fat, ambas com prescrição de alimentos saudáveis. Além disso, todas tinham a recomendação de começar a fazer atividade física.
Os pesquisadores também realizaram exames genéticos nos participantes para verificar se a perda de peso tinha relação com três variações na sequência de DNA associadas previamente à resposta a regimes alimentares. Ao fim de 12 meses, independentemente das variantes genéticas, a perda de peso foi estatisticamente igual no grupo do low carb e do low fat. No primeiro caso, os participantes estavam 6kg mais magros. No segundo, 5,3kg. No estudo, a concentração de insulina no sangue também não influenciou o nível de emagrecimento e de manutenção do peso. “Em 2010, saíram estudos que acompanharam os participantes por 30 anos, concluindo que não importa a dieta que você faz, contanto que se modifique o estilo de vida. Esse novo estudo reforça isso.
Além disso, ele mostra que só o perfil genético não responde por que cada pessoa reage de forma diferente a uma mesma dieta”, destaca a endocrinologista da clínica Metasense Jamilly Drago, membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem). A nutricionista Gabriella Alves, da Corpometria Brasil, lembra que a genética tem um papel na resposta às dietas, mas que isso apenas não define os resultados.
Metabolismo Moldável
Hábitos alimentares e prática de atividade física influenciam o comportamento do organismo e, inclusive, uma mesma pessoa terá reações diferentes ao longo da vida. “O metabolismo muda, é possível modulá-lo com alimentação e atividade física. Quando se está obeso, por exemplo, a flora intestinal é completamente diferente de quando se está magro”, explica a nutricionista, lembrando que a composição da flora tem relação direta com o metabolismo. Gabriella Alves ressalta que uma forma não invasiva e menos cara que o exame genético de avaliar o melhor tipo de dieta para cada pessoa é a calorimetria indireta. Esse teste indica se o indivíduo queima mais gordura ou carboidrato, o que ajuda a definir as estratégias de perda de peso mais adequadas.
Para a assessora parlamentar Jessica Dionisio de Melo, 27 anos, o que deu mais resultado, até hoje, foi a dieta low carb. “Eu tentei a dieta do abacaxi e a da sopa, que só me fizeram ficar com fome e não tiveram efeito nenhum”, conta. Quando engravidou, ela confessa que deixou de controlar o peso, e o resultado foram 20kg a mais na balança. “Seis meses depois que tive minha filha, comecei uma dieta sem ingestão de carboidrato. Aí, quando cheguei à minha meta, de 70kg, parei. Agora na segunda semana de janeiro, recomecei e já estou com 65kg”, comemora. A meta de Jessica é chegar aos 60kg. Para isso, pretende procurar um especialista, pois está fazendo a dieta por conta própria, estimulada pelo desafio de uma nutricionista que segue no Instagram. Além de reduzir os carboidratos, a assessora faz treinos diariamente e largou os industrializados.
Risco de carência
A nutricionista Patricia de Castro Campos, pós-graduada em nutrição clínica e esportiva, recomenda que se evite qualquer dieta que imponha restrições absolutas a determinados nutrientes. “Para a redução de peso, todos os modelos costumam ser eficazes, já que estão reduzindo a ingesta de calorias e, automaticamente, reduzindo o peso. As dietas restritivas, por si só, acabam levando ao desenvolvimento de alguma carência de nutrientes. Assim, a readequação alimentar individual e correta é fundamental para suprir qualquer necessidade nutricional”, ensina (Leia três perguntas para).
Christopher Gardner afirma que o estudo “fecha portas para algumas questões, mas abre para outras”. O professor de medicina de Stanford quer saber, agora, se a microbiota ou os padrões de expressão genética estão por trás da resposta individual às dietas. “Talvez, a principal lição desse estudo seja que a estratégia fundamental para perder peso, com uma abordagem low carb ou low fat, é similar: Coma menos açúcar, menos farinha refinada e o máximo de vegetais possível. Em ambos os grupos, ouvimos das pessoas que mais perderam peso que nós as ajudamos a mudar a relação com a comida, e que, agora, estão mais conscientes sobre o que comem”, comemora.
Três perguntas para
Patricia de Castro Campos, nutricionista especialista em nutrição clínica e esportiva do Instituto Castro e Santos
O resultado do estudo sugere uma personalização das dietas de perda de peso? O estudo mostra que a variabilidade substancial da resposta à perda de peso sugere que algumas estratégias podem funcionar melhor para alguns indivíduos do que para outros, e que nenhuma dieta deveria ser recomendada universalmente, pois o ser humano é biologicamente diferente. Além disso, as perdas de peso variaram amplamente dentro dos grupos estudados, mostrando que cada pessoa reage de forma única à perda de peso. Ou seja, não existe uma fórmula pronta e perfeita para todo mundo.
Duas das dietas testadas são baseadas na restrição de um grupo alimentar. Essas dietas são sustentáveis em longo prazo? Não. O estudo mostra duas amostras de dietas, uma com baixo teor de carboidratos e outra com baixo teor de gorduras, as quais não se percebem grandes diferenças em ambos os resultados esperados. Dessa forma, nenhuma dieta pode ser sustentada em longo prazo, pois todas elas visam à restrição alimentar. Nenhum indivíduo saudável deve se submeter a grandes restrições alimentares por longos períodos de tempo. O correto é a readequação das quantidades calóricas, lipídicas e proteicas ingeridas por dia e a qualidade do produto consumido. É importante frisar que a reeducação alimentar e a ingestão adequada de alimentos são as melhores alternativas para o controle e a prevenção de doenças ocasionadas pelo excesso de carboidratos e lipídios.
Agora estamos em uma fase de demonização de carboidratos. O estudo, de certa forma, “redime” esse grupo alimentar? Sim. As dietas com baixo teor de carboidratos se tornaram uma estratégia popular para perda e controle de peso nos últimos anos. Entretanto, durante o estudo, as perdas de peso não variaram amplamente dentro dos grupos de dieta, mostrando que, tanto no grupo de redução de carboidratos quanto no grupo de redução de lipídios, a perda de peso, a redução do colesterol e a diminuição da glicemia obtiveram resultados semelhantes. A pesquisa não conseguiu mostrar o porquê da semelhança dos resultados dos grupos. Nesse sentido, é perceptível o fato de que não existe uma diferença clara entre as duas dietas, já que os resultados foram muito parecidos. Portanto, o fato do estudo não obter clareza entre os resultados, de certa forma, “redime” a demonização do carboidrato, pois eles, em ambas as dietas, obtiveram eficiência na perda de peso e na redução de calorias.
Fonte: Ciência e Saúde – CB, por Paloma Oliveto de 21/02/2018.
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