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Estudo contradiz a tese de que é possível estar acima do peso e saudável

Segundo os cientistas, os genes dos obesos têm padrões anormais de resposta à insulina mesmo quando o exame tradicional não acusa o problema.
Nos últimos anos, ao mesmo tempo em que o mundo registrou um aumento considerável no número de pessoas acima do peso, surgiu um movimento, endossado por alguns médicos, de defesa da “obesidade saudável”.
De acordo com essa corrente, até 30% dos indivíduos com índice de massa corporal (IMC) igual ou maior que 30 não apresentariam fatores de risco associados ao excesso de gordura. Contudo, uma pesquisa do Instituto Karolinska, da Suécia, alerta que isso não passa de um perigoso mito. O artigo, publicado na revista Cell Reports, alerta: não existem níveis seguros de obesidade. Mesmo quem está com os exames aparentemente em dia pode desenvolver problemas como doenças cardiovasculares e diabetes por culpa do peso.
O conceito da “obesidade saudável” apoia-se no fato de que um percentual das pessoas com IMC acima de 30 não é resistente à insulina. Esse importante hormônio captura a glicose presente no sangue e a envia para o interior celular, de forma que o açúcar seja transformado em energia. Mas algumas condições, como o excesso de gordura no corpo, faz com que as células inflamem e se tornem resistentes à ação da insulina. A glicose acumula-se no organismo e, em consequência, surgem problemas graves, como hipertensão, triglicerídeo alto, comprometimento cardiovascular e acúmulo de substâncias tóxicas, entre outros.
Uma das formas de avaliar o funcionamento da insulina é o exame de glicemia em jejum, no qual se retira uma amostra do sangue no início da manhã para medir a quantidade de açúcar circulante. Quem é resistente ao hormônio apresenta taxas muito altas, já que as células impedem a transformação da glicose em energia.
O problema, segundo Mikael Rydén, pesquisador do Instituto Karolinska que liderou o estudo, é que não há consenso se esse teste seria o melhor critério para avaliar a saúde metabólica de indivíduos obesos.Ele, então, avaliou a resposta à insulina de 15 pessoas saudáveis que nunca tiveram excesso de peso e de 50 obesos, que participavam de uma pesquisa sobre a cirurgia de redução de estômago.
Foram realizadas biópsias do tecido adiposo branco (TAB) do abdômen de todos eles em duas etapas: antes e duas horas depois de receberem uma infusão de insulina e glicose na veia. De acordo com a taxa de captação de glicose, os pesquisadores classificaram 21 obesos como sensíveis à insulina (teoricamente, os saudáveis) e 29 como resistentes ao hormônio.
A surpresa veio quando eles sequenciaram o material genético do interior das mitocôndrias — estruturas celulares responsáveis pelo processo de fabricação de energia — das amostras. Fossem sensíveis ou resistentes à insulina, os genes de todos os participantes obesos exibiam padrões anormais, se comportando da mesma forma em resposta à insulina, uma maneira bem diferente da verificada na amostra dos indivíduos saudáveis que nunca sofreram de excesso de peso. Rydén lembra que a obesidade é o principal fator por trás da alteração da expressão dos genes: “Por isso, não há como falar em ‘obesidade saudável’. Temos de continuar insistindo no combate a esse problema”, afirma .
Doença crônica
Para o endocrinologista Flávio A. Cadegiani, membro da Associação Brasileira para Estudos da Obesidade (Abeso) e médico da clínica Corpometria, o trabalho sueco traz diversas implicações importantes. A primeira delas é que, ao provar a inexistência de obesidade saudável, o estudo reforça que o excesso de peso é uma doença crônica e que, portanto, deve ser tratado com seriedade. Em segundo lugar, ele afirma que os distúrbios metabólicos em indivíduos obesos podem estar sendo subdiagnosticados. “O exame de glicemia de jejum, que é passado normalmente para os pacientes, pode não ser suficiente”, afirma.
Na pesquisa, os obesos com sensibilidade à insulina pareciam saudáveis quando se avaliava somente esse critério. Contudo, o comportamento dos genes das células de gordura mostrava-se alterado ao se injetar açúcar na corrente sanguínea dos participantes, um exame conhecido como curva glicêmica, feito pela manhã, antes da ingestão de alimentos e horas depois do paciente se alimentar. “Em média, demora-se cinco anos para a glicemia em jejum elevar ao nível que apareceria na curva glicêmica.
Existe um subdiagnóstico de resistência à insulina nos obesos por uma certa inércia na medicina mundial, que espera os sintomas aparecerem para passar a curva glicêmica”, critica. “A minha recomendação é que todos os obesos façam esse exame.” O médico lembra que o aumento da resistência à insulina intensifica os fatores de risco associados ao problema, como doenças cardiovasculares e alguns tipos de câncer.
Fonte: Ciência e Saúde do CB , em 19/08/2016 por Paloma Oliveto
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