Alice Koechlin, do Instituto Internacional de Pesquisa Preventiva em Lyon, França, disse no Congresso que uma análise ligando quase um milhão de pacientes com Diabetes Tipo 2 , na Lombardia (Itália) e na Bélgica, com casos registrados de câncer pancreático , mostrou que 50% de todos os casos deste tipo de tumor, nas duas regiões, foram diagnosticados dentro de um ano do diagnóstico de diabetes tipo 2 e em pacientes recebendo sua primeira prescrição para controlá-la.
“Na Bélgica, 25% dos casos foram diagnosticados em 90 dias e na Lombardia 18%. Após o primeiro ano, a proporção de cânceres pancreáticos diagnosticados caiu drasticamente “, disse a pesquisadora. Em comparação com pacientes que foram capazes de continuar usando antidiabéticos orais, os pacientes estudados tinham um risco 3,5 vezes maior de serem diagnosticados com câncer de pâncreas nos primeiros três meses após a primeira prescrição envolvendo incretinomiméticos (hormônios metabólicos que estimulam o pâncreas a produzir mais insulina para baixar os níveis de glicose no sangue); este risco caiu para 2,3 vezes nos próximos três a seis meses, para um risco de duas vezes para os próximos seis a 12 meses e 1,7 vezes após o primeiro ano.
Entre os pacientes que já tinham Diabetes Tipo 2 e estavam usando drogas antidiabéticas orais, a mudança para os incretinomiméticos ou para insulina aconteceu mais rapidamente entre os pacientes diabéticos que foram posteriormente diagnosticados com câncer de pâncreas. Além disso, uma deterioração da sua condição que os obrigou a mudar para uma terapia anti-diabética mais agressiva, com injecções de insulina, esteve associada a um risco sete vezes maior de ser diagnosticado com câncer pancreático.
Alice Koechlin, o professor Philippe Autier (também do International Prevention Research Institute) e colegas na Bélgica e Itália utilizaram dados de prescrição para identificar 368.377 doentes com diabetes tipo 2 na Bélgica, entre 2008 e 2013, e 456.311 doentes na Lombardia entre 2008 e 2012. Os dados foram relacionados a casos de câncer de pâncreas do Belgian Cancer Registry e a bases de dados de alta hospitalar na Lombardia. Foram 885 e 1.872 casos de câncer pancreático diagnosticados durante este período na Bélgica e na Lombardia, respectivamente.
Os pesquisadores dizem que embora seja sabido já há algum tempo que existe uma associação entre o diabetes do tipo 2 e o câncer de pâncreas, esta relação é complexa. As terapias envolvendo incretinas reduzem a hiperglicemia diabética estimulando a liberação de insulina pelo pâncreas. Estes fármacos são tipicamente prescritos quando os fármacos antidiabéticos orais já não podem controlar os níveis de glicose no sangue . Devido aos seus efeitos estimulantes sobre o pâncreas, há muito se pensava que este tipo de terapia poderia promover a ocorrência de câncer no pâncreas.
No entanto, sabe-se também que o câncer de pâncreas pode causar diabetes. O presente estudo mostra que as terapias com incretinomiméticos são frequentemente prescritas a pacientes cujo diabetes é causado por um câncer de pâncreas ainda não diagnosticado. Porque o câncer pancreático finalmente se torna sintomático e é assim diagnosticado, parece que é a ingestão de drogas incretinomiméticas que poderia ser o gatilho do câncer pancreático, enquanto na realidade é o câncer pancreático que provoca uma deterioração da diabetes, que é seguida pela prescrição de incretinomiméticos.
Esse fenômeno é chamado de “causalidade reversa” (reverse causation). O estudo também mostra que a causalidade reversa observada para fármacos envolvendo incretina também é observada para outras terapias anti-diabéticas, em particular para a terapia com insulina.
Médicos e pacientes diabéticos devem estar cientes de que o aparecimento de diabetes ou a sua rápida deterioração pode ser o primeiro sinal de câncer de pâncreas ainda não diagnosticado e deve ser efetuada a sua investigação precoce. No entanto, investigar se um paciente tem câncer de pâncreas não diagnosticado é difícil e os pesquisadores dizem que o uso de bases de dados de prescrição poderia ajudar a desenvolver métodos para identificar quais pacientes podem ter câncer pancreático precoce não sintomático.
“Não há atualmente nenhum bom método, não-invasivo, para detectar o câncer pancreático que ainda não está mostrando nenhum sinal ou sintoma visível. Os cientistas esperam que os resultados encorajem a pesquisa de marcadores sanguíneos indicando a presença de câncer de pâncreas, o que poderia orientar as decisões para realizar um exame de confirmação”, concluiu Koechlin.
O câncer de pâncreas é um dos tumores mais letais, em parte porque é difícil de detectar numa fase precoce, mas também porque existem poucos tratamentos eficazes para ele. Menos de um por cento das pessoas vivem dez ou mais anos após o diagnóstico. Na Europa, cerca de 104.000 novos casos foram diagnosticados em 2012 e aproximadamente o mesmo número de pessoas morreram a partir dele. Em todo o mundo, havia cerca de 338.000 casos de câncer de pâncreas diagnosticados em 2012 e 330.000 pessoas morreram por causa disso.
Notícia publica no Medical Journal – 31/01/17 – News.Med. BR, 2017